Havia preocupações sobre nossa proposta de roteiro, um tanto ousada para meninos e meninas de 16 ou 17, naquela tarde de domingo. Visitar a exposição do Miró e assistir Galileu Galilei.
Miró, nada fácil, seria pura descoberta.
Eram raros os tinham assistido espetáculos de teatro mais adultos que não fossem aquelas comedinhas em salas de shoppings. Bertold Brecht, poucos o identificavam. Galileu Galilei e sua intérprete, Denise Fraga, eram mais conhecidos e as principais razões para que muitos acompanhassem o grupo.
Primeiro, exposição do Miró. Surpreendeu-nos pela quantidade, mais de cem obras, e pela síntese que faz do riquíssimo trabalho do artista catalão. Em duas grandes salas, organizadas cronologicamente, é fácil observar as variações e proposições estilísticas que Miró manifestou em sua vida: a juventude, onde ainda são percebidos linhas e traços que, de alguma forma, indicam contenções nos projetos e maturidade quando não se observam mais limites para elementos e cores (surrealista? Abstrato? Infantil? Pouco importa.) e que desequilibram o olhar.
Depois seguimos para Galileu Galilei com suas mais de duas horas sem pausas. Haveria protestos se houvessem paradas.
Denise Fraga como Galileu em nenhum momento nos desloca sendo uma atriz interpretando um homem.
Para aqueles que estreavam como expectadores foi uma iniciação majestática. Cenários, luzes, sons e elenco combinaram-se com recursos cênicos para se gastar todos os superlativos.
O texto de Brecht, para muitos um dos melhores de todos os tempos, retira-nos do lugar comum. Estão muito presentes as oposições renascentistas: fé e ciência, dogmas religiosos e os métodos experimentais, Inquisição e Justiça. Também estão lá as questões da relação entre poder e a dúvida, as pretensões humanistas em confronto com anseios mundanos (segundo a própria Denise Fraga, na verdade, é Brecht servindo-se Galileu para falar de si mesmo). Em todo tempo somos colocados diante de temas profundamente humanos, sejam da própria humanidade ou dos indivíduos.
E antes que se considere que as duas horas são tensas e “cults”, a montagem traz-nos leveza e humor em alguns momentos sutis e, em outros, deliciosamente carnavalescos e fanfarrões.
Desce o pano, aplausos entusiasmados e sinceros.
E, pós-tudo, o elenco, liderado pela protagonista, que também é produtora, nos encontra para bate-papo, fotos e agradecimentos de quem assistiu e, creiam, de quem foi assistido.